sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

A África pensa, logo existe...

Silvana Saraiva*
O pensador nigeriano K. C. Anyanwu define a filosofia africana como “aquela que se interessa pela maneira com que o povo africano do passado e do presente entende seu destino e o mundo em que vive”. Tomando este pensamento como ponto de partida, podemos expandir seu significado à diáspora africana ou, mais pontualmente, ao Brasil e seus descendentes.
O fato é que a compreensão dos seus destinos está camuflada em perspectivas de uma sociedade escorada em preconceitos passados, porém maquiados em discursos do presente. Embora promulgada há mais de 10 anos, a lei 10.639 (que inclui ensino da história africana e afro brasileira no currículo escolar) continua letra morta. Pouco se viu de transformação no modo de pensar e tratar do brasileiro no que tange às relações que o Brasil deve estabelecer com o continente africano. 
Na última década, a expansão comercial africana estabeleceu novos recordes de crescimento. Em 2005, Angola chegou à casa dos 15%. Hoje, a Costa do Marfim caminha para quinto ano em 9%, segundo o Banco Mundial. No entanto, o Brasil mantém uma miopia generalizada ao olhar a África.
No auge da gestão do ex-ministro das Relações Exteriores, embaixador Celso Amorim, crescemos cerca de 400% nas nossas relações com a África, que no quadro geral representou apenas 0,8% em relação a outros países. Falamos da China (42%), Reino Unido (12,5%) e Estados Unidos (8%). Neste quadro, o dinamismo brasileiro em relação ao continente é quase inexistente. 
Com estes números, poderíamos inferir que não há como piorar. No entanto, as estatísticas mostram que hoje nossa relação com África caiu para 0,2%. Trocando em miúdos: inexiste! Com mais de 80 milhões de afro-brasileiros, ainda não somos capazes de entender o mundo no qual vivemos e suas possibilidades.
Há um provérbio africano que diz: “a união do rebanho obriga o leão a deitar-se com fome”. O fortalecimento do eixo sul não colocará os leões para dormirem de barriga vazia, pois a fartura de oportunidades excede ao estômago dos principais players da América Latina. Porém, tira a África do alvo dos neocolonizadores e traz uma perspectiva de ações mais sustentáveis para o continente.
No último Fórum realizado pela ONU na Costa do Marfim, discutiu-se sobre a África Emergente, que apontava para um crescimento expressivo, mas sem reflexo na geração de empregos e melhores infraestruturas. O Brasil, em relação a outros países da diáspora, possui uma experiência mais consistente em programas sociais e no combate à pobreza extrema. Isso sem contar os programas de incentivo ao empreendedorismo, micro crédito para agricultura familiar, entre outros.
Por outro lado, enquanto nossa economia se retraiu, a da África permanece inalterada, mesmo com a queda do preço do barril de petróleo. As vastas riquezas naturais e os investimentos em agricultura nos próximos anos tornarão o continente africano cada vez mais sustentável e atraente para os investidores internacionais.
*Silvana Saraiva é presidente mundial do Instituto Feafro

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